A Associação dos Remanescentes do Quilombo Rio dos Macacos e a Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia – AATR/BA vêm, por meio desta nota, denunciar o processo de criminalização que Edinei Messias dos Santos, membro da comunidade, vem sofrendo em decorrência ao processo judicial militar movido pelo Ministério Público Militar – MPM contra sua atuação em defesa dos direitos territoriais.
Como é de conhecimento internacional, a Comunidade Quilombola de Rio dos Macacos enfrenta desde os anos 1950 um conflito fundiário instalado após a invasão territorial sofrida pela Marinha do Brasil – MB, que, desde então, empreendeu diversos processos de violência violências físicas, sexuais, patrimoniais, morais etc. contra as famílias quilombolas, além da consecutiva negação de acesso às políticas públicas básicas, como políticas de saúde, educação, moradia e saneamento básico.
A partir dos anos 2010, quando as tentativas de expulsão das famílias quilombolas pela Marinha do Brasil se multiplicaram, a comunidade intensificou os processos de resistência e articulação de parceiros para defesa dos seus direitos fundamentais, a exemplo da autonomia territorial e o direito de locomoção garantidos pela Constituição Federal de 1988.
No entanto, como exercício de seu poder autoritário, a Marinha do Brasil sempre impediu a comunidade de constituir vias próprias de acesso ao território, condicionando como principal forma de entrada a portaria da Vila Naval de Aratu, decidindo sem critérios o exercício de ir e vir de seus membros, os expondo ainda mais à face do racismo institucional.
Em um desses eventos, no dia 26/10/ 2017, durante uma atividade educativa que seria realizada na comunidade pela Universidade Federal do Recôncavo Baiano – UFRB, a MB vetou a entrada das professoras e estudantes, condicionando inclusive mulheres, crianças e idosos a permanecerem acampados na portaria até às 04:00 do dia 27/10/2017. A vedação de acesso da UFRB ocorreu como retaliação direta após representantes da comunidade terem participado do período de sessões da Comissão Interamericana de Direitos Humanos – CIDH, no Uruguai, onde denunciaram o quadro de vulnerabilização e riscos decorrentes da luta pela titulação.
No contexto desta data, Edinei Messias dos Santos foi acusado pela Marinha do Brasil de depredação do patrimônio público, processado e sentenciado pelo Judiciário a 06 meses de detenção em razão de sua participação na ocupação que resistia na portaria à violação dos direitos da comunidade de gerir autonomamente o direito de acesso ao território tradicional.
É importante lembrar que a portaria da Vila Naval já foi palco de outros processos de violência contra Edinei, a exemplo das agressões que sofreu por militares, junto com sua irmã, Rose Meire dos Santos Silva, em 2014; e o conjunto de assédios, ofensas, provocações e agressões desferidas contra ele por militares cotidianamente.
Mais uma vez, o aparato judicial é manuseado pelos agentes públicos brasileiros como mecanismo de criminalização, violência e perseguição da luta quilombola de Rio dos Macacos, mesmo após o alcance da titulação do território e a decisão da CIDH de que o Estado implemente medidas cautelares que garantam a segurança das famílias da comunidade.
É urgente que os órgãos do Sistema de Justiça revejam a decisão emitida contra Edinei, assim como que os demais órgãos de proteção dos Direitos Humanos garantam a vida, a integridade moral e física do mesmo frente à constante violação sofrida em decorrência da luta política por direitos que são legítimos e históricos.
Simões Filho, 03 de setembro de 2020.
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